“JOEIRAS
AO ALTO”
A
TRADIÇÃO DOS PAPAGAIOS ARTESANAIS NA ILHA DA MADEIRA
De autoria de Marta Caires, do Jornal
Correio da Venezuela e editado recentemente neste órgão de informação, deixamos
aqui publicado o seu texto-reportagem sobre as Joeiras, modelo de papagaios de
papel de seda, uma tradição que ainda é praticada em diversas localidades da
Ilha da Madeira.
Para se perceber a importância destes
brinquedos, é preciso imaginar a Ilha da Madeira há 40 anos atrás, quando nem
todas as casas tinham eletricidade e telefone havia só um, daqueles pretos, na
mercearia, na igreja ou em casa de alguém com posses. Nem sequer havia luz em
todos os caminhos. O céu estava livre de fios cruzados e as crianças, que
corriam em bandos pelos sítios, tinham poucos brinquedos. Um carrinho na Festa
e mesmo assim, não era para todos.
Sem brinquedos e três meses de férias
da escola, o remédio era inventar e as joeiras eram então muito populares. Não
se podia dizer que fossem baratas, mas era uma coisa que se fazia com alguma
segurança. O mais caro era mesmo o barbante – fio norte – que até se dava o
nome de barbante de joeira. O melhor, no entanto, é explicar como é que se
fazia uma joeira, os investimentos que implicavam e o prazer que dava a seguir
de lança-lo ao ar.
A qualidade do produto final dependia,
depois, da habilidade do construtor. O jeitinho ajudava e uns tinham mais que
os outros. Os irmãos mais velhos, primos e até o avô eram ‘mão de obra’
importante. Momento difícil era a junção das três canas. A joeira clássica é um
hexágono, mas havia maiores com oito e doze lados que só conseguiam ser
lançados em dias de muito vento. Unir as canas – ou meias canas no caso das
joeiras mais pequenas e leves – quase sempre era com ajuda. Um segurava e o
outro passava o barbante. Um furo no meio, um reforço redondo. Colado o papel,
juntavam-se as guias de fio que se ligavam ao longo do barbante. O rabo era
muito importante, servia de contra peso e levava pedaços de pano, quase sempre
de lençóis velhos.
Em certos dias, viam-se no céu, em
cada sítio, uma meia dúzia, maiores, mais pequenas, com os rabos compridos a
fazer ‘esses’. O pior era quando o azar espreitava, o vento mudava e a joeira
enrolava-se nos poucos fios da luz. O melhor que se podia fazer era salvar o
barbante, que era caro e dava para outra. De resto, a joeira morta, ficava a
rodar até ser só um esqueleto e o tempo da chuva desfazer o que restava. E os
azares aconteciam, mas os rapazes de há 40 anos não desistiam e voltavam a
construir e a lançar a sorte as suas joeiras às cores.”
BalõesPortugal parabeniza Marta Caires, do Jornal Correio
da Venezuela, autora deste excelente texto-documentário, que enobrece e
valoriza em muito a tradição dos papagaios Joeiras, como forma de uma arte
popular.
Publicamos algumas
imagens de vários exemplares de joeiras construídos na Ilha da Madeira, que ao
longo destes últimos anos vão resistindo e preservando a sua arte.
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